domingo, 15 de janeiro de 2012

Portugal e a União (2)

Não há acção política possível que não tenha o seu contrário, a inacção, sempre representada como acto político consumado; não há, portanto, vazio ou omissão de cariz político que se possa tomar como acidental ou negligente. Saber se a inacção incorpora uma teoria política é assunto diverso, mas dificilmente um observador atento e crítico se pode permitir esquecer que uma ausência é, enfim, um movimento mais no sentido do laissez-faire.

A simetria entre uma acção e sua negação é, em Política, um simulacro da oposição entre A e não-A, que na sua impura forma lógica assume afinal a oposição entre A e B. Por outras palavras, por via do universalizante, a inacção política não é a negação de uma acção, mas uma outra, nova e incompatível.

Daqui ser-nos-ia lícito partir para a releitura de uma volumosa quantidade de argumentação política usada nos mais variados campos, mas um exemplo basta para mostrar os efeitos possíveis, sobre a dialética política, desta reconfiguração: o debate quanto à tomada de posição do Estado Português no âmbito da transformação europeia em curso.

Do lado da acção, alguns defendem que Portugal deve, na medida das suas possibilidades, procurar aliados no seio da União Europeia que com ele partilhem certas características - no plano económico perspectivas de medíocre crescimento económico, problemas de solvência; no político, a sujeição a interferência externa; no geográfico, a localização periférica - e estejam de acordo quanto a um número razoável de objectivos, incluindo certamente aqueles relacionados com as características que os tornam tão semelhantes, mas também o desejo de impedir uma Europa definida pelo eixo franco-alemão. Do lado "oposto", afirmam outros que Portugal não deve estabelecer sequer esse tipo de afinidades, pois isso compromete o caminho sacrificial que Portugal aceitou fazer, põe em causa o alcançar das metas impostas, e não tem reais possibilidades práticas de sucesso.

Excluindo, para simplificação, a vital discussão quanto ao fundamento de todos os argumentos envolvidos, sobra-nos o esqueleto da hipotética acção política: agir ou não agir. Ora, retomando o motivo inicial, a assunção de uma política omissa no que respeita à questão da aliança com outros estados-membro volve-se acção deliberada de nada fazer, movimento positivo de continuar um percurso individual no meio de uma crise sistémica. Neste caso como em tantos outros, a subtil recolocação dos termos em que se traduz a liberdade de acção traz consigo outros modos de julgar, quanto à virtude, qualquer das opções tomadas. É que se agir é ingénuo e inútil, e não agir é sensato e pragmático, agir solitariamente é gesto contínuo de autoflagelação.

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